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COLUNA DO PUTIU


20 DE JULHO: DIA DO PUTIÚ, AMIGO!


Toda boa ideia reclama de nós, os seus eventuais beneficiários, os meritórios aplausos, o que significa, em primeira análise, o reconhecimento da genialidade de quem a concebeu e a disposição para lhe conceder a devida existência. Há também nesse ato, de validade pública, a clara manifestação da expectativa de que, superando todas as etapas do seu processamento, a elogiável inspiração se transforme numa realidade inquestionavelmente explorável, de que se extraiam bons frutos no curso do seu trajeto de eficiência e eficácia. 

Em outros termos, uma ideia, para realmente ser boa, tem de mostrar a que veio, sempre com a perspectiva conceitual de autoria atribuída ao iluminado inventor norte-americano Tomas Alva Edson, o pai da lâmpada elétrica, segundo a qual “Genialidade é 1% inspiração e 99% transpiração”. Deduzo daí que, se a ação de plantar – uma ideia, no caso – merece os lauréis cabíveis à inspiração, ou  seja, ao primeiro passo a ser dado, o suor do cultivo é que vai assegurar a colheita do produto idealizado no ato do gênio, atestando, por extensão, a sua validade. Concluo que inspiração sem prática acaba por fenecer na fonte, ou seja, na genialidade de quem a concebeu. 

Convém enfatizar que até os deuses, mesmo providos das suas supremas divindades, uma vez ou outra, puseram/põem a mão no barro ou na massa para provar que suas ideias foram/são plenamente factíveis e exitosas. O exemplo maior é bíblico: Deus criou o mundo em seis dias; só foi descansar no sétimo. Vejam, amigas e amigos, quanto custou pôr em prática uma boa ideia; embora haja quem – incluindo o autor destas mal traçadas linhas – defenda a justa causa do arrependimento divino em relação ao feito (uma humanidade que adora matar e até morrer, sob o heroico manto do guerrear, desde o barro e por todos os séculos adiante – até mesmo os que estão por vir –, renega a finalidade da criação: a Vida na Terra!).     

Pois bem. É exatamente com esse pensamento – exceto a crítica final, é óbvio! – que eu, um putiuense de raiz, embora vivendo em outras plagas por razões circunstanciais e ora bem além de qualquer propósito de apreciação e crítica, embalo a criança gestada no ideário pessoal do amigo Luiz Carlos Barros Barbosa, fomentador, por excelência, de eventos vários em prol da produção e manutenção da cultura do bairro onde nasceu e ao qual devota o benquerer próprio de um bom filho: o Putiú.

De longe, acompanhei a longa jornada desse destemido senhor, um jovem mais que sonhador de alma irrequieta, obviamente com o salutar apoio de familiares – mulher e filhos – e amigos verdadeiros, no sentido de dar vida a mais uma ideia por ele gestada e capaz de capitalizar validade histórica: a de marcar no calendário do bairro Putiú um dia todo seu e, por extensão, dos putiuenses. 

Senti-me, de  pronto, movido a me fazer presente na reunião inaugural do que poderia vir a ser a execução do projeto, na qual, tendo o Galpão Ferroviário (ex oficina de consertos da RVC/RFFSA) como ambiente com características bem sugestivas à proposta, dar-se-ia, na manhã do dia 17 de março, um sábado, a discussão entre putiuenses e sobre duas questões centrais: a viabilidade da efetivação de uma data festiva para o bairro – “É viável criar o Dia do Putiú?” – e a definição, no caso de resposta positiva à citada indagação, de um dia e mês com razoável valor histórico e capaz de merecer sua legitimação, popular e legal, além da forma como implementar a sua ocorrência atual e futura.

Até coloquei na bolsa de viagem uma data – 14 de abril (a) – para usá-la, no momento oportuno, como a minha indicação [obviamente arrimada em justificativas de natureza histórica, conforme a Nota do Autor (a)]; e nisso já se continha a minha aprovação quanto à constituição de uma marca específica para essa ora pujante comunidade, na forma de uma data comemorativa, com eventos que, envolvendo o povo, rendesse a devida representatividade.      

Ocorre que o aguaceiro caído dos plúmbeos céus de Fortaleza naquele domingo, numa sequência pouco vista nas quadras invernosas mais recentes, pondo em risco viagens por terra, impossibilitou-me de participar de tal evento. A idade – já não me deixo levar pelos rompantes da juventude, da qual só me restam saudades... e muitas! – e as condições de saúde, tendendo à precariedade, também concorreram para essa sentida renúncia à aqui declarada vontade. Coisas da vida; vocês hão de compreender, diletantes leitoras e leitores.  

O certo é que, apesar de uma frequência não compatível – a meu exclusivo sentir – com o real significado do encontro, não por falta de publicidade na forma mais usual na atualidade: as redes sociais, ali restou decidido que: a) o Putiú merecia, sim, contar com um dia todo seu; b) o 20 de julho seria, a partir de então, esse dia. 

Obviamente, não se considerou, para tanto, o fato de tratar-se do Dia do Amigo (o que em nada desmereceria a escolha; afinal, a amizade sempre foi um sentimento marcante entre os filhos do nosso querido torrão). O que aqui pretendo realçar é que a escolha – pelo que soube – se deu arrimada em resultado de pesquisa histórica, reveladora de que foi num 20 de julho (b) que o Império (sob o comando de Dom Pedro II), tendo assumido o projeto – até então de iniciativa privada –, determinou, por ato formal, a retomada da construção da Estrada de Ferro Baturité, que interligaria Fortaleza ao Crato, paralisada por problemas de difícil solução, incluindo os de natureza econômico-financeira, disso resultando a extensão da rede ferroviária desde Parangaba (Arronches, à época) até Baturité, com o Putiú (c) sendo estrategicamente escolhido para receber a respectiva estação.

Após aprovada a proposta de realização de jogos olímpicos, numa versão – modesta que fosse – dos que logo em seguida ocorreriam em Paris, bem mais estilizados, formaram-se dois grupos com objetivos distintos – um cultural e outro esportivo –, aos quais caberia a responsabilidade de promover a I Olimpíada do Putiú, nos dias 19, 20 e 21 de julho, e, assim, marcar festivamente a data histórica então instituída.

E foi o que aconteceu. 

E nós – eu e a minha eterna parceira – lá estivemos (de corpo e alma).

Assistimos, já no começo da noite de sexta-feira (19), ao desfile de abertura do evento, com atletas das diversas modalidades esportivas incluídas na competição e representantes de famílias tradicionais da terra, sob a cadência de marchas executadas pela Banda Municipal e a proteção de agentes do trânsito, perfazendo o trajeto entre as pracinhas do Putiú e do Salgado. 

Ali acompanhamos o hasteamento das bandeiras ao som do Hino Nacional Brasileiro, o juramento dos atletas, o acendimento da pira olímpica (Vicente Pinto, respeitável desportista) e a declaração de abertura dos jogos (Luiz Carlos). Na sequência, na quadra não-coberta contígua à praça, presenciamos os movimentos iniciais das disputas por troféu e medalhas na modalidade futsal.

Já no sábado (20), optamos por visitar familiares no curso do dia. Assim, deixamos de assistir aos jogos de dama, sinuca de gaveta e tênis de mesa (o tradicional pingue-pongue). À noite, acompanhados de um casal amigo, na verdade um irmão meu (Wagner) e esposa (Marta), estivemos – eu e Marileide – na praça do Salgado, onde ocorreu a Noite de Artes e Cultural da Nação Putiú (produção da Comunidade Kolping Manga (d) e realização do sítio putiu.com.br), com destaque para estas atrações: a) dona Eliane Rezadeira (mestra da Cultura e dos Saberes); e b) das mulheres das artes da Casa Kolping (crochê, bordado, pintura e bijuteria). 

Na circular área de apresentações (arquibancada e palco), o programa ofereceu a um bom público um verdadeiro show do versátil artista e mestre da Cultura (dos fazeres e saberes) Paulo George Barros Silva, que, além de cantar e dançar com indumentária de palhaço genialmente estilizada, introduziu agradáveis apresentações que mesclaram canto de grupos infanto-juvenis, os coralinos da Obra Kolping, e música popular brasileira na voz de Thete Lima, cantora da terra, sempre sob a batuta do Cleciano, da Thalia e da Masé Galvão. Em resumo: uma programação de alto nível e, portanto, merecedora de aplausos.

E veio o domingo (21). Às 8 da manhã, a minha eterna parceira cumpriu o seu insubstituível ritual de mulher católica fervorosa: missa na igreja dos Arcanjos, bem à frente da casa da mana Eliane, que sempre nos recebe tão bem, com a sua cabeleira farta e naturalmente preta (lembrei-me da graúna de Alencar, no romance Iracema) – apesar da idade (já não é mais a professora/educadora em atividade) –, o olhar de apreciável negror e o sorriso de acolhimento inigualável, driblando os rigores de algumas comorbidades. 

E, se à mulher coube cumprir a religiosa devoção, ao marido impôs-se a prazerosa obrigação, ora de cunho social. E lá fui eu para a pracinha (e) contígua ao “pódio” da Maria Fumaça, um exemplar das máquinas a vapor que, embora consumissem água e lenha e enchessem o ar de fumaça, puxavam uma “enfieira” de vagões transportando gente ou produtos regionais, favorecendo a economia dos nossos rincões, cujas histórias não podem furtar-se à rica presença delas.                       

No calçadão, onde antes havia trilhos da via férrea, sobre os quais corriam os trens de passageiros – que mexiam e remexiam no nosso baú de emoções; eles imperturbavelmente realistas e nós poeticamente românticos – ou de cargas com destinos vários, atletas agora corriam contra o insensível e irrefutável cronômetro, movidos pelo sonho de pôr no peito uma medalha de qualquer cor, não importando se de ouro, prata ou bronze; afinal, já dizia o Barão de Coubertin (Pierre de), o francês fundador dos Jogos Olímpicos da Era Moderna, que “O importante não é vencer, mas competir” (f). 

Não me perdoei por haver chegado tarde demais para outras competições, a saber: a) arremesso de peso; b) ciclismo; c) salto em distância; e d) a corrida de 2,5km, em pista improvisada (estrada carroçável para a localidade Raposa). Mas me alegrei por participar da festa de encerramento, por volta das 11 horas, com curtos discursos sobre o evento e rápidas entregas de muitas medalhas. 

De lá saí satisfeito e orgulhoso por perceber que ainda mantenho as raízes fincadas em tão fecundas terras, após cerca de quase 7 décadas; por recolher “afagos na alma”, advindos de benevolentes pessoas que assim provam haver entre nós uma sincera amizade; e, ainda, por exibir no peito uma medalha de ouro, a mim outorgada pela Comissão organizadora do evento, em face, segundo seus integrantes, da minha colaboração com publicidade do evento nas redes sociais por onde trafego. Controlei a emoção e segurei as lágrimas. 

No sítio Vista Alegre, no Coió de Baixo (g), do casal Wagner-Marta, almoçamos um baião-de-dois de feijão verde (feito em panela de barro e fogão a carvão), com adjutório de batata doce e jerimum, e o acompanhamento de churrasco de carnes bovina e suína. Algo que, na condição de sertanejo inquebrantável, eu considero o manjar dos deuses.

Antes do final da tarde, retornamos à nossa casa do Parque Araxá, com recepção extremamente saudosa dos netos que, por causa do Fortal, não usufruíram do que, pra nós, pareceu uma viagem de volta ao passado; lá onde escrevemos as nossas narrativas primárias, básicas, o alicerce pétreo que dá sólida sustentação à edificação que juntos – eu e a minha eterna parceira – construímos no curso da nossa profícua parceria. E que certamente nos eternizará: a família.

Amigas e amigos, agora o 20 de julho também marcará o Dia do Putiú. E que seja sempre festivo.


Notas do Autor:

  1. PUTIÚ – O MEU BERÇO ESPLÊNDIDO (Facebook, 14 de abril de 2024) – Segundo o historiógrafo e pesquisador baturiteense Pedro Catão, em estudo publicado em algum ano da década de 1930 na Revista do Instituto do Ceará e intitulado Baturité (Subsídio Geográfico, Histórico e Estatístico), os sítios às margens do rio Putiú foram integrados ao patrimônio da então criada Villa do Monte Mor o novo da América (antes Missão jesuítica), em termo firmado em 14 de abril de 1764, há exatos 260 anos. Logo depois a vila receberia o nome de Baturité (terra alta, em língua indígena).

  2. Certamente nos estertores do século XIX.

  3. Para Catão, Putiú significava, em língua indígena, rio dos camarões (Poti = camarão; ú = água).

  4. O Projeto Kolping é uma ação sem fins lucrativos e tem como objetivo ofertar para a comunidade momentos de ensino e aprendizagem, propiciando a popularização da cultura e educação, tirando as crianças, jovens e adultos da ociosidade através de arte e educação. Manga é, hoje, um dos logradouros que integram o Grande Putiú.

  5. Praça Luiz Leiteiro.

  6. Um recado incidental para quem se portou como insolente, ao exigir cachê para participar de um evento comemorativo de um fato essencialmente público; embora esteja convicto de que na concorrida agenda dele nunca vai sobrar tempo para a leitura, nem das “letrinhas” dos incontáveis contratos.

  7. Nas proximidades dos sítios de propriedade dos amigos: 1) o casal Dim (Raimundo de Moura) e professora Socorro (dona Maria Pereira de Moura); 2) o craque Carlos Pedrosa.

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